segunda-feira, 23 de março de 2009

Pobres Servos da Divina Providência


Filipe Sakalongo Ulica


1. Fale um pouco de você. A quanto tempo está aqui, onde nascestes?

Eu nasci em Angola, em, África, em um cidade litorânea, no Sul de Angola. Vivo no Brasil desde o ano de 2006, nas dependência da minha congregação.

2. Seus pais ainda vivem, tens irmãos, quanto tempo faz que não os vê?

Tenho cinco irmãos, todos residem em Angola. Os meus pais já são falecidos e amo-os sempre. Tem um ano que não vejo os meus irmãos, pois no ano passado tive férias e pode vê-los.
3. Você é um religioso consagrado, qual é a sua congregação?
Faço parte de uma congregação Religiosa chamada Pobres Servos da Divina Providência, cujo carisma me enamora bastante. Nossa espiritualidade é “Fé e confiança em Deus que é Pai-Mãe e Tudo” e manifestar em todo mundo, sobretudo lá onde ninguém quer ir, que Deus cuida cada um de nós é nosso maior desafio. Sou um jovem de 30 anos, religioso consagrado há 5 anos.

4. Poderia falar um pouco de quando sentiu um chamado de Deus?

A minha fé me diz que Deus chama desde sempre e para sempre. Seu chamado é dirige a pessoa concreta e deve ser respondido de maneira pessoal e livre, embora certas mediações ajudem no discernimento.
Comecei a sentir bem forte esse chamado ainda quando tinha os meus 10 anos de idade. Os meus pais também me ajudaram a compreender e interpretar esse chamado de Deus. Tive que buscar esclarecimento do meu pároco e catequistas e depois entrei num grupo vocacional onde fiquei durante 4 anos. Só aos 18 anos de idade é que ingressei no Seminário.
Durante toda a minha caminhada como vocacionado, ainda na paróquia, depois como seminarista, muitas descobertas foram feitas. Muitas coisas tive de deixar para trás, na medida em que a minha vocação foi se aclarando. Cada dia de minha caminhada vocacional, tive de dar resposta a essa vocação, não nova, mas sim, confirmando cada dia a minha resposta inicial. Pouco a pouco fui compreendendo que, assim como o chamado é perseverante, também é a minha resposta deve ser perseverante. Assim como o chamado é comprometedor, também, é a minha resposta.

5. Porque agora está buscando o sacerdócio?

Sinto-me chamado para exercer o sacerdócio, mas o que busco não é o sacerdócio, senão a minha santificação pessoal. Eu vejo o sacerdócio não como um fim, mas como um meio, um ministério colocado ao serviço dos irmãos para Deus. Quero com os irmãos chegar a Deus. Eu busco Deus.

6. Qual a comunidade que você vive atualmente, e o que faz lá?






Depois de ter vivido numa comunidade de ação social, no começo do ano fui solicitado por meus superiores para servir na comunidade paroquial da Restinga, na paróquia de Nossa Senhora da Misericórdia, uma das vilas de Porto Alegre.
Sinto muita vontade de enumerar muitas coisas que eu faço nas pastorais, que são várias, mas para mim não é isso o mais importante. O fundamental seria o “como tenho sido” nas pastorais; se o meu jeito de ser faz passar o rosto de Deus àquele povo. Tenho procurado fortificar as lideranças e despertar novas lideranças, para que elas acompanhem seus grupos nas pastorais, sobretudo, a pastoral do batismo, do catequista, do dízimo, nas capelas e os coroinhas. Temo que o meu fazer ofusque o Ser de Deus.

7. A pastoral que está fazendo tem dado resultado positivo imediato, ou será necessário um tempo maior?

O resultado não depende de mim. A mim cabe cuidar com muito zelo àqueles que me confiaram. Cada flor brota fruto em seu tempo. Cada fruto amadurece em seu tempo. Cada fruto é diferente do outro, embora sejam da mesma árvore. Por outro lado, não faz muito tempo que estou nessa comunidade.
Como seria interessante se os frutos começassem a amadurecer em mim primeiro...!

8. Esta comunidade em que está vivendo, têm demonstrado uma boa aceitação deste trabalho?

Quando se fala de periferia se pensa em comunidades de revoltosos, agressivos, descompromissados, “vagabundos” traficantes. Tem esses aí, como existem em condomínios fechados com dois portões, muros altos, cerca elétrica, vigia e câmeras. Mas, na periferia tem muito mais que isso aí. O coletivo fala muito alto, por isso que elas são chamadas de “comunidade”. Eles se chamam “meu irmão”.
A comunidade em que faço parte é maravilhosa. Buscam novos horizontes, novas idéias. Quer crescer. Precisa de lideranças que os compreenda, que os escute, mesmo que não falem nada. É um povo que ama. Alias, na avenida principal encontra-se escrito no letreiro “Tinga teu povo te ama”. É um povo que só quer amar.
O maior problema não é se eles aceitam o nosso trabalho, mas se nós os aceitamos na sua realidade e se com o nosso trabalho não confirmamos mais ainda o nosso preconceito. Ninguém gostaria ser tratado como um “coitado”!

9. É possível usar as próprias lideranças da comunidade para obter um resultado crescente?

Muitas vezes pensamos que gente de periferia só executa idéias que vêm já prontas a partir de fora dela. Gente da Restinga é capaz, gente da Restinga acredita nos seus sonhos. A Restinga só muda com o protagonismo do seu povo. Devemos parar com a idéia que sustenta que “o santo da terra não faz milagre”. Simplesmente meu papel é ajudar e não substituir as lideranças já existentes e aquelas que vão surgindo.

10. Já pensou em desistir frente às dificuldades que aparecem?

Tem certos momentos que a dificuldade fala mais alto que os sonhos que a gente carrega. Nessa hora dá vontade de desistir dos sonhos.
Mas, aonde irei para me ocultar da dificuldade, dos problemas?! Em qualquer lugar lá estão os problemas. Os momentos difíceis amadurecem os nossos projetos, embora não entendamos imediatamente, na hora. A revisão do sonho e do projeto pessoal me ajudam a perseverar e renovar a minha resposta ao chamado.
O preocupante não são os problemas, mas o jeito como eu lido com eles.

11. Sabemos que você é Secretário de Redação e Edição de Arte, da revista A Ponte. Qual o objetivo desta revista?

Eu já não sou mais secretário dessa Revista. A minha nova missão não me permite trabalhar nela como antes, embora ainda esteja ligado a revista.
A Ponte nasceu para servir como elo de ligação entre os Religiosos Pobres Servos e seus familiares. Através dela as informações chegavam ao conhecimento de toda família Calabriana. Hoje ela não é só elo entre os religiosos e seus familiares. É um meio de comunicação para todos os interessados. Ela tem mais de 2500 assinantes, só no Brasil, chegando a vários países dos quatro continentes.
Seu objetivo principal é evangelizar, usando o meio de comunicação.

12. Gostaria de através da tua experiência de vida, deixar alguma mensagem, como um testemunho de esperança, fé e amor?

Quero lhes falar da missão.
Quer o soldado quer o vocacionado exercem uma missão. Mas, existe uma grande diferença entre ambos:
a) o soldado vale-se de sua estratégia, o vocacionado vale-se do plano de Deus;
b) o soldado é um mercenário, o vocacionado é um missionário;
c) o soldado parte para um tempo determinado, o vocacionado, para um tempo indeterminado;
d) o soldado vai desconfiando, o vocacionado parte confiante.
e) O soldado carrega na mochila o projeto estratégico para matar, o vocacionado leva coração um projeto para que todos tenham vida.
f) O soldado protege a sua vida, o vocacionado doa a sua vida;
g) Para o soldado vale a lei do mais forte, o vocacionado é a voz dos sem voz, os pobres, e propõe a vez do fraco.
Deus quando chama não revela toda sua intenção de uma só vez, ele pouco a pouco vai revelando, na medida que se vai revelando. Mas, acima de tudo Ele ama sem igual: incondicionalmente.
SHALOM!

2 comentários:

  1. Gostei muito de ter lido a diferença entre o soldado e o vocacionado. Espero que os soldados não fiquem ofendidos, alias, até porque eu sou o soldado.

    Joaquim Jacinto Chilembo - Marinheiro de Angola

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  2. Regozijo-me por ter sido o Coordenador da Comissão Central de Preparação de Ordenação Presbiteral do Diácono Filipe Sakalongo Ulica,em 23.12.2012 na Paróquia de S. Martinho de Lima, pelo D. Eugénio Dal Corso - Bispo da Diocese de Benguela, esperando que na missão que tem como vocacionado, sendo diferente do soldado, tenha mesmo uma partida confiante, a voz dos sem voz... Que DEUS abençoe-o nas suas missões e que tenha coragem e preseverança para vencer os obstaculos que venha encontrar.

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